Filósofo brasileiro morre aos 85 anos na França

Publicado em: 03/05/2020 às 12:59
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Morre aos 85 anos o filósofo Ruy Fausto, um dos principais teóricos brasileiros do marxismo. O corpo de Ruy foi encontrado pela ex-mulher na manhã da sexta-feira (1º) no apartamento dele em Paris, onde morava sozinho. Segundo o sociólogo Sérgio Fausto, sobrinho do filósofo, Ruy sofreu um infarto entre a noite da quinta-feira (30) e a manhã da sexta-feira.

Professor emérito da USP e doutor em Filosofia pela Universidade Paris 1, Ruy Fausto escreveu uma dezena de livros, entre eles ‘Caminhos da Esquerda’, publicado em 2017, no qual analisa os erros da esquerda no Brasil e propõe um novo trajeto para a vertente política.

Ruy dedicou grande parte de sua obra ao estudo das ideias do filósofo alemão Karl Marx (1818-1883), com destaque para os três tomos da série ‘Marx: Lógica e Política’. Também publicou ‘A Esquerda Difícil: Em Torno do Paradigma e do Destino das Revoluções do Século 20 e Alguns Outros Temas’ e ‘O Ciclo do Totalitarismo’, entre outros.

Nascido em São Paulo em 22 de janeiro de 1935, Ruy era irmão do historiador e cientista político Boris Fausto. Deixa a ex-esposa e a filha Luísa. De acordo com Sérgio, o sobrinho, o corpo foi encontrado recostado no piano. Ele lembra que o tio era um grande apreciador de jazz e tocava frequentemente.

Vladimir Safatle, professor de Filosofia da USP, amigo de Ruy por mais de 20 anos, diz que ele foi um dos grandes intelectuais do país “pela originalidade que ele imprimiu na leitura não só do marxismo, mas da dialética como um todo”.

“Também foi um exímio analista da realidade nacional. Nunca se furtou a polêmicas, o que é uma coisa rara entre nós. Ele não tinha problema em entrar numa polêmica com amigos. Mesmo comigo, que era amigo de 20 e poucos anos. E eu sou grato pela honestidade intelectual dele”, diz Safatle.

Além do aspecto intelectual, Safatle destaca o aspecto pessoal (“Foi uma das pessoas que mais me mostrou o significado da palavra amizade”) e lembra de polêmicas. “Tínhamos debates duros, e nossa amizade saiu intacta. Por exemplo, ele participou da minha banca de livre-docência e no meio dela me chamou de terrorista. Fiquei com raiva durante um tempo, quase um ano depois a gente se encontrou e começou a conversar. Eu falei: ‘Nossa, acabei de esquecer que estava com raiva de você’”, lembra.

A historiadora e antropóloga Lília Moritz Schwarcz afirma que Ruy Fausto faz parte de uma geração que está indo embora, com um conhecimento enciclopédico – no bom sentido – e não tão compartimentado como as gerações subsequentes. “Era um filósofo formado da maneira mais clássica, mais rigorosa. E que fez da filosofia um instrumento de crítica política e social. Ele não se acomodava nas caixinhas. No livro mais recente, ‘Caminhos da Esquerda’, ele provocou da esquerda à direita. Perdemos um grande intérprete do Brasil”, diz ela.

“Ruy Fausto manteve ao longo da vida uma rara coerência: foi sempre um intelectual do campo da esquerda. Conseguiu, assim, realizar uma alta e constante reflexão a favor da liberdade e da igualdade. Fará muita falta”, afirma o cientista político André Singer. “Ele foi um grande pensador brasileiro”, diz Laura Carvalho, economista e professora da USP. “Tem uma grande importância não só como um teórico, como alguém que desenvolveu a teoria marxista, mas alguém de muita relevância nesse ambiente de intolerância do Brasil, ao refletir sobre soluções democráticas. É uma perda muito grande, ainda mais nesse momento”.

“Muito triste. Grande figura humana e pensador de fôlego. Fará muita falta. Meus sentimentos à família”, escreveu Fernando Haddad, candidato derrotado do PT na última eleição presidencial, em seu perfil no Twitter. “Ruy Fausto foi meu professor e uma figura humana e intelectual de enorme grandeza. Vai fazer falta à universidade e ao país”, disse Pablo Ortellado, professor da USP, também em seu perfil no Twitter.

Em seu último texto publicado na Folha de São Paulo, no caderno Ilustríssima, em julho de 2019, Ruy Fausto argumenta que a desmoralização do ex-juiz da Lava Jato Sérgio Moro não inocentava o PT de seus erros. Também na Ilustríssima, Ruy escreveu em novembro de 2018, pouco após a vitória de Jair Bolsonaro (sem partido) na eleição presidencial, que a única coisa rigorosa no discurso do guru bolsonarista Olavo de Carvalho eram os palavrões.

Em ensaio publicado ainda durante a campanha, o filósofo afirmou que Haddad precisava mudar para evitar a catástrofe.



Fonte: Espaço PB com Folhapress – Redação: contato@espacopb.com.br

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