
Poderia ser somente mais uma história de assombração. Fatos sobrenaturais com doses exageradas de palavras para impor apreensão e medo aos outros. Mas não é. A história a seguir aconteceu realmente e eu, de certa forma, fui testemunha do ocorrido com o meu irmão Totonho (Marcos Antônio), por volta da segunda metade dos anos de 1970, lá na minha Três Corações. Uma experiência transcendental que mudou os rumos da vida dele e marcou a minha.
Alguns meses antes do fato ocorrido com Totonho, uma família de evangélicos voltava da igreja um tanto tarde da noite. Eles andavam a pé pelo acostamento da avenida que liga os Bairros de Santa Tereza e São Jerônimo, quando um carro descontrolado terminou por atropelar uma menina (quase moça adolescente). Ela morreu no local, onde dias depois foi afixada uma cruz-de-beira-de-estrada, marcando a tragédia e em memória da vítima.
A cruz (não sei dizer se ainda hoje existe) ficava à beira de um barranco, ao lado de uma cerca de arame farpado que separava a avenida do famoso Pasto do Bitu (hoje Parque Dondinho e que já foi tema aqui em uma crônica recente).
Certa noite, eu estava em casa sozinho quando Totonho, em disparada e branco feito uma vela, entrou pela porta da cozinha em pânico e salpicando frases desconexas, com feições de horror e demonstrando muito medo. E ele contou que acabara de ver o espírito de uma menina (que ele supunha ser a vítima do acidente de carro), que, por meio do pensamento, lhe estaria pedindo ajuda. Ainda em pânico, Totonho me implorava para que eu e ele fizéssemos uma reza ou uma prece para que a menina morta alcançasse a luz da espiritualidade.
Próximo à cruz colocada às margens da avenida e já dentro do Pasto do Bitu, haviam duas grandes árvores frondosas e bastante altas. Meu irmão me contou que, na claridade da lua cheia, caminhava nessas proximidades com os seus dois cachorros, Panther e Leão. Em certo momento, os cães pararam e começaram a latir olhando para o alto e em direção a uma dessas árvores. Ao olhar também, Totonho teve a visagem (como se diz aqui na Paraíba) de uma menina vestida de branco “flutuando” ao lado da parte mais alta do tronco da árvore. E essa alma se comunicava com ele por meio do pensamento, pedindo ajuda, uma luz... Daí a disparada dele em direção à nossa casa.
Totonho, que à época teria algo em torno dos 18 ou 19 anos, passou o resto de sua vida contando essa história. Seus relatos, no início, eram constantes. Depois foram ficando mais esporádicos. Mas sempre se referia a esses fatos. Por isso reafirmo que esta não é só mais uma história de assombração. Foi um acontecimento real e que repercutiu bastante em nossas vidas, principalmente na dele.
Até a sua morte, ocorrida em setembro deste ano, Totonho sofria da doença a que ele era diagnosticado: esquizofrenia. Coincidência ou não, essa doença começou a se manifestar na vida dele logo após a visão que teve do “espírito da menina de branco”. Acredito que a doença um dia iria se manifestar de qualquer maneira, porém a visão da menina teria sido o gatilho para que ela aflorasse.
De acordo com os manuais médicos, a esquizofrenia “é um transtorno mental crônico que se caracteriza por uma perda de contato com a realidade (psicose), alucinações, delírios, pensamento e comportamento anômalo; é uma doença complexa que pode variar de pessoa para pessoa, e que pode ter um grande impacto na vida diária”.
Fonte: Espaço PB com jornal A União (texto originalmente publicado na seção Memorial, da edição do dia 17 de dezembro de 2024) – Foto: Pixabay – Contato: jorgerezende.imprensa@gmail.com
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